TATIANA ALTBERG


 

MINIBIO

Tatiana Altberg nasceu em 1974 no Rio de Janeiro. Vive e trabalha no Rio de Janeiro.
É artista visual, com ampla experiência em projetos ligados à design, fotografia, vídeo e educação pela arte. Graduada em comunicação visual e pós-graduada em Fotografia como instrumento de pesquisa nas ciências sociais. Participou no projeto FABRICA Centro de Pesquisa de Oliviero Toscani, Itália.

Desde 2003 desenvolve o projeto Mão na Lata para jovens da Maré em parceria com a Redes da Maré. O Mão na Lata é um projeto, um grupo, um conjunto de ações em arte e educação, que propõe um espaço investigativo, de criação coletiva, um espaço de trocas de experiência, convivência e compartilhamento de mundos utilizando a fotografia e o texto. Ao longo dos seus 15 anos de atividades o Mão na Lata participou de diversas exposições, individuais e coletivas, oficinas, seminários, publicou livros, entre eles, Mão na Lata e Berro d’água, pela editora Nova Fronteira, 2006 e Cada dia meu pensamento é diferente, pela editora NAU, 2012. Além de ter produzido uma série de documentários sobre a construção dos processos e um curta metragem de animação em pixelation. Parte das imagens do livro Cada dia dia meu pensamento é diferente, integram o acervo permanente do Museu de Arte do Rio -MAR.

De 2003 a 2010 Tatiana foi responsável pela identidade visual da Bienal Internacional de fotografia FotoRio. Em 2006 implementou o núcleo de fotografia pinhole no programa Imagens do Povo do Observatório de Favelas. Em 2008 foi contemplada com a Bolsa Funarte de Estímulo à Criação Artística com o projeto Faça-se Luz. Tem fotografias do ensaio Ophelia ou a água, pertencentes à Coleção Joaquim Paiva, que foram expostas no Théâtre de la Photographie et de l’Image (Nice), e estão atualmente em comodato no Museu de Arte Moderna do Rio. Em 2005 publicou o livro de fotografia Sí Por Cuba, editora Cosac Naify.

Em 2017 realizou o projeto Retrato Falado para jovens que cometeram atos infracionais, internos do Departamento Geral de Ações Socioeducativas do Rio de Janeiro (DEGASE), projeto contemplado pelo programa Rumos Itaú Cultural.
 
www.maonalata.com.br
www.retratofalado.com.br
vimeo.com/user10778991
tatianaaltberg.carbonmade.com
www.maonalata.com.br/artigo/290
revistazcultural.pacc.ufrj.br
www.degase.rj.gov.br
tvbrasil.ebc.com.br
www.independent.co.uk

 

A PROPOSTA

Residência Secretaria de Estado de Segurança

Tatiana Altberg trabalhou com a equipe da Subsecretaria de Educação, Valorização e Prevenção da Secretaria de Estado de Segurança formada por 33 pessoas, entre policiais militares, policiais civis e profissionais de diversas áreas, como psicológos, sociólogos, entre outros.

A artista, durante dois meses, participou de reuniões, grupos de trabalho e grupos de estudos, palestras e conversas internas. Acompanhou o dia a dia da equipe, se aproximando para conhecer os projetos e as pessoas que os executavam.

Tatiana percebeu que o momento de maior abertura e disponibilidade era o momento de almoço em uma sala de convivência. Ela passou a priorizar almoçar na Secretaria para conseguir acompanhar também as falas que fugiam à institucionalidade das reuniões.

Para viabilizar a participação da equipe, cuja rotina era um tanto atribulada, criou um dispositivo em forma de jogo. Periodicamente deixava envelopes nas mesas de cada um com proposições para serem respondidas.

As respostas das proposições, em forma de texto e imagem, eram colocadas nas paredes da sala de convivência. Dessa maneira contruiu-se, gradativamente, ao longo do ano, uma espécie de constelação com as histórias e imagens das subjetividades formadas pela equipe. Uma sala em que a alteridade passou a ser espelho, onde um pôde se ver, ver o outro, e se ver refletido no outro. Um jogo de empatia e estranhamento que convocou reflexões individuais e coletivas, operando um deslocamento dos lugares que cada um ocupa em seus micro e macro universos.

 

REGISTRO

 

PROPOSIÇÕES

Foram deixados envelopes na mesa de cada um dos funcionários com as instruções de participação; os envelopes continham proposições para serem elaboradas, em forma de texto ou imagem;

Olá

Começamos!

Quero te convidar a participar de um jogo de construção coletiva que faremos durante a minha residência na Secretaria. Ao longo do tempo que estarei aqui, você receberá pequenas proposições para serem realizadas em um tempo predeterminado.

As respostas serão expostas nas paredes brancas da sala onde nos alimentamos diariamente. Criaremos nessas paredes uma espécie de mapa, uma cartografia das subjetividades que compõem esse espaço coletivo da Secretaria.

As falas não serão identificadas, para que você se sinta à vontade para expressar o que quer que seja.

Ninguém é obrigado a participar, porém, esse mapa não refletirá a diversidade e riqueza da equipe que forma a Secretaria sem a sua participação.

Espero que se sinta instigado a participar.

Um abraço,

Tatiana Altberg

Foram 16 proposições diferentes realizadas de abril a dezembro. Cada proposição determinou um prazo de realização estipulado de acordo com a complexidade da proposição, ou as possibilidades na agenda da equipe.

 

Proposição número 1

Conte uma cena que você viveu ou viu e que você não esquece. Algo que tenha te marcado. Pode ter acontecido durante a vida adulta ou na infância. Pode ser triste ou alegre. Tente descrever com o máximo de detalhes visuais para que possamos enxergar a cena que você conta. Se quiser, conte mais de uma.

As proposições iniciais tinham como intuito trabalhar a sensiblização para a imagem e suas possibilidades narrativas, simbólicas e estéticas. A partir da quarta proposição, Tatiana montou um laboratório fotográfico dentro da Secretaria e deu ínicio também a um trabalho com a fotografia pinhole.

Foram feitas pequenas oficinas de construção de câmera pinhole para aqueles que demonstraram interesse em construir sua própria câmera.

As primeiras proposições fotográficas aconteceram no prédio da Secretaria e arredores, junto com a artista, para que fossem orientados em como usar a pinhole. Assim nas proposições seguintes fotografariam em suas casas.

As proposições trataram de assuntos diversos, sempre a partir de uma perspectiva de autorrepresentação, em que os materiais deveriam ser acessados, buscados, a partir da história de vida e das experiências do participante.

 

Proposição número 7

Você tem ou já teve um lugar seguro, um lugar onde se sinta, ou sentisse seguro e protegido?

Descreva esse lugar, com o máximo de detalhes que puder, de modo que ele possa ser visualizado. Por exemplo: esse lugar tem algum som? Algum cheiro te faz lembrar esse lugar? Esse lugar te traz alguma sensação física ou alguma emoção? Como é a luz nesse lugar?

O lugar não precisa ser atual, ele pode ser antigo, da adolescência ou da infância. Esse lugar pode ser real ou pode ter sido criado, inventado para te acalmar em momentos difíceis. Descreva-o.

Dessa forma, as proposições criaram um espaço para que os integrantes da equipe pudessem parar em meio a rotina e se escutar, entrar em contato consigo, com suas trajetórias e memórias. Uma forma de implicar suas subjetividades nos processos coletivos dos projetos da Secretaria, como colocado por Tatiana:

Parar o que se está fazendo em algum momento do dia para ir procurar um lugar para fazer uma foto. Esperar segundos em silêncio, contando e observando algo. Revelar a imagem, vê-la também silenciosamente, surgindo no papel branco, são pequenos gestos de reconfiguração do próprio corpo no espaço que de alguma forma operam deslocamentos interessantes para o trabalho.

 

Proposição número 10

Você olha pela sua janela todo dia, ou quase todo dia. Você já parou para refletir sobre o que você vê e o que você não vê pela sua janela?

A partir dessa reflexão quero propor duas ações:

A. Com a câmera pinhole faça uma fotografia da sua janela. Use a tabela de tempos e a experiência que acumulou até agora para fazer a foto.
B. Escreva um texto dizendo o que você vê (ou não vê) da janela.

 A perspectiva pessoal foi o norte das proposições, ainda que elas tratassem de assuntos como segurança.

 

Proposição número 13

A proposição número 13 pedia que os participantes escrevessem 3 perguntas:

uma sobre si mesmo, sobre a própria vida. Outra sobre o mundo, as pessoas, as relações, o planeta, a natureza, enfim, sobre qualquer coisa que não fosse a própria pessoa. E a última, sobre a polícia, sobre segurança pública. Surgiram muitas perguntas. Elas foram colocadas nas paredes entre os textos e fotografias, em formatos grandes em um material vinílico, como os que figuram em exposições. Ao término da residência, que coincindiu com a extinção da Secretaria de Segurança como um todo, a equipe sugeriu à Tatiana fazer um ritual simbólico de retirada do material da parede, de forma a levar consigo parte de sua produção ou presentear os colegas para se depedirem uns dos outros. Como as perguntas, haviam sido fixadas com um material mais complicado de ser retirado sem que fosse danificado, Tatiana decidiu deixá-las na parede.

Ao final da residência restaram nas paredes do prédio que durante 23 anos abrigou a Secretaria de Segurança, algumas perguntas ecoando de forma silenciosa.

Quais são meus sonhos ainda não realizados? E se não existisse polícia? Quantos ainda terão que morrer para que essa guerra acabe? Por que as pessoas tem medo da polícia? Será que está valendo a pena? O que significa para um agente de segurança o “servir e proteger”? Quem eu acordei hoje? Por que a essência humana é tão má? Existem mundos paralelos? Quando a farda pode ser um fardo? E agora, o que eu quero pra minha vida? Por que a polícia é tão desrespeitada no Brasil? Por que é tão difícil olhar pra mim? Por que nos tornamos tão intolerantes e ansiosos ? Diante da sociedade em que vivemos, temos a polícia que queremos ou temos a polícia que merecemos? Por que eu tenho tanta raiva? É preciso gritar pra ser ouvido?

Quem eu acordei hoje?

O livro, fruto do trabalho realizado na RASP, reúne anotações, textos e fotografias feitas a partir de proposições realizadas por Tatiana, em 2018, em um trabalho colaborativo com os 33 servidores públicos da Subsecretaria de Educação, Valorização e Prevenção da Secretaria de Estado de Segurança do Rio de Janeiro.

Ao todo, foram realizadas 16 proposições diferentes, e as respostas a cada uma foram colocadas nas paredes da sala de convivência, substituindo os tons escuros de madeira pelas histórias e imagens produzidas pela equipe. Essas imagens estão agora documentadas também no livro.

Durante os meses em que esteve com os servidores públicos, Tatiana criou um jogo por meio de envelopes que deixava nas mesas de cada um com proposições para serem elaboradas, em forma de texto ou imagem. “Os envelopes abriam o espaço para que as pessoas entrassem em contato com memórias, com reflexões e coisas da própria vida”, explica. O término da residência coincidiu com o período em que a Secretaria de Segurança foi extinta pelo Governo do Rio.
As proposições iniciais tinham como intuito trabalhar a sensibilização dos servidores para a imagem e suas possibilidades narrativas e estéticas.